Por que damos valor às vidas humanas? Por que achamos que o mundo deva ser justo? Por que devemos nos importar com a natureza? Quais as motivações das pessoas? E que nome dar a todas as coisas da vida que não entendemos, não sabemos descrever, mas com as quais temos de lidar o tempo todo?




Comunicação Irracional

por Outro corpo em movimento

Nós possuímos um sistema de comunicação bastante refinado em relação aos outros animais. Na maioria das vezes podemos expressar, com minúcias, exatamente o que sentimos. Podemos perguntar ao outro qualquer coisa, e com isso temos a condição de saber o que ele está sentindo, pensando... podemos compreendê-lo. Não pretendo ficar enumerando tudo o que conseguimos com a nossa comunicação, mas eu entendo que ela realmente nos propicia incontáveis articulações, que seriam capazes de tornar as relações humanas claras e confortavelmente bem estabelecidas.
Só que... fazemos um péssimo uso da nossa comunicação e criamos uma série de pequenos mecanismos que impedem o seu livre uso. Nos esforçamos pra conseguir disfarçar o que sentimos. Que contradição! Talvez sejamos a única espécie que consegue demonstrar tão bem os sentimentos e nos empenhamos em desenvolver métodos pra atrofiar essa capacidade.
Acho que o Leo diria que : se somos assim, deve ser porque evolutivamente “percebemos” que demonstrar os sentimentos não é uma coisa boa, que pode trazer complicações para a nossa sobrevivência.
Essa idéia pra mim seria ingênua. Os nossos comportamentos não são todos pragmaticamente explicáveis. Alguns deles são absurdos, ridículos e impossibilitam sim uma vida mais agradável.
O fato de as coisas acontecerem não é suficiente para validá-las, ou seja, não é porque as coisas acontecem de determinada forma que elas têm uma explicação super bonitinha. As vezes elas são medonhas de verdade, e acho que esse caso da comunicação é um exemplo disso.
Já que estou com essa mania de inventar argumentos científicos, vou sugerir que, instintivamente, teríamos a tendência de falar o que pensamos, porém, por motivos culturais acabamos nos educando pra não falar. As crianças falam o que sentem e pensam, aí são consideradas inconvenientes e perturbadoras, então aprendem a não fazer isso e assim podem conviver muito bem com as outras pessoas. Mas por causa disso (não se expressar livremente) acabamos colecionando um monte de problemas e dificuldades.
Algumas vezes sabemos exatamente o que queremos de uma pessoa, poderíamos dizer a ela diretamente para que ela pudesse pensar e responder se iria ou não ajudar. Mas, o que costumamos fazer é lançar indiretas, insinuações e esperar que a pessoa ofereça aquilo o que bastava que pedíssemos. Complicamos a comunicação, dificultamos, pioramos. É como se pegássemos um instrumento muito bem feito para produzir um lindo som e estragássemos algumas peças, colocássemos obstáculos na saída do som, emfim, fizéssemos com que o instrumento produzisse um som infinitamente menos bonito do que seria capaz de produzir.
No filme “clube da luta” tem uma cena em que um cara diz que vai procurar um hotel para dormir, mas o outro percebe que no fundo ele queria pedir para dormir em sua casa, então ele fala: “pode pedir!”. Este é um ótimo exemplo do que fazemos com tanta freqüência. Era tão simples, bastava pedir, não precisava fazer rodeios, buscando uma maneira de conseguir que o cara oferecesse coincidentemente hospedagem. Geralmente a coisa é tão fácil, nossa linguagem é altamente adequada para que consigamos ser claros e objetivos, mas buscamos um caminho muito mais longo e tortuoso para tentar dizer o que queremos.
Por que temos tanto medo de falar a verdade, sem rodeios, de dizer o que estamos sentindo, o que queremos...? Por que não conseguimos aproveitar o ótimo sistema que dispomos?
Talvez o Leo alegue que não dizemos o que sentimos por medo de magoar os outros, por medo de sermos grossos ou inconvenientes (como as crianças costumam ser), ou pra evitar que surjam más interpretações. Mas isso acontece justamente porque nunca dizemos as coisas, se tivéssemos o hábito de falar claramente, quando alguém ficasse magoado ou se sentisse ofendido, iria dizer, explicar... então aquele que o magoou poderia refletir, se justificar, pedir desculpas, e assim a comunicação fluiria muito bem. Foi isso que eu disse no começo, que nós conseguiríamos estabelecer relações claras e bem resolvidas se não ficássemos criando obstáculos, porque nossa comunicação nos permite fazer isto.É muito difícil de mudar essa tradição (de se comunicar mal) porque quando alguém costuma se expressar livremente, chovem acusações e comentários negativos, pois acho que, incompreensivelmete, a maioria prefere assim como está.

2 Comentários:

Anonymous Anônimo disse...

Acho que conter a fala às vezes é necessário, para manter a harmonia social. Acho que devemos sempre buscar tratar as outras pessoas com respeito e educação, ao invés de dizer coisas impensadas. Conter a fala ajuda a moldar o pensamento para que ele seja respeitoso, acho... porém é possível que isso, de outro lado, seja uma inibição para o extravasamento das emoções... acho que é preciso ser assertivo, comunicando suas emoções com franqueza e firmeza mas respeito. Não tenho certeza.

Dependendo da pessoa com quem se está conversando, dizer coisas diretamente, de uma maneira quase "autista", pode ser mais ou menos aceitável, é preciso ter cuidado.

Se todos disséssemos o que queremos, por exemplo, na situação do clube da luta, em que o cara diz que vai procurar um hotel para dormir, mas queria pedir para dormir na casa do outro, o problema é que se ele pedisse diretamente para dormir na casa do outro, isso poderia ser um incômodo. É um problema quando falta assertividade, a pessoa poderia dizer que sim só por educação e se deixar ser incomodada, ou se fosse direta e franca também, poderia dizer que não, e com isso incomodar a outra pessoa pela recusa e a si mesma por ter que recusar.

Talvez o melhor seja seguir algumas regras de educação, como por exemplo, ao pedir que alguém faça alguma coisa, ao invés de ordenar dizer por favor, mesmo que na nossa cabeça estivéssemos pensando dar uma ordem. A diferença é como isso será aceito pela outra pessoa, com má ou boa vontade.

A nossa linguagem, na minha opinião, é uma tradução com perda ou modificação de conteúdo, dos sentimentos para os conceitos que são as palavras. Se as palavras forem uma boa tradução dos sentimentos, talvez seja porque os sentimentos foram influenciados para se conformar às palavras, ou estejam baseados nas palavras. Isso é um exemplo de influência exterior, cultural (palavras), moldando o interior, o sentimentos e os comportamentos.

Como a forma externa e cultural de comunicação influencia o comportamento interno, acho que é melhor ter uma linguagem respeitosa, que dê origem a pensamentos respeitosos, que uma linguagem espontanea e desrespeitosa, que dê origem a hábitos de pensamento desrespeitosos.

Ou talvez o efeito fosse melhor se todo mundo falasse os sentimentos abertamente, com assertividade grande o bastante. Isso é difícil de dizer, pois depende de estimativas, e faltam dados empíricos. Se fosse feito um estudo científico mostrando o que acontece mesmo ao se falar abertamente ou ao se conter a fala, se poderia saber o que aconteceria realmente.

quinta-feira, julho 31, 2008 5:21:00 AM  
Anonymous Anônimo disse...

Novamente muito bom post, desculpa se a resposta soou seca.

sexta-feira, agosto 01, 2008 6:48:00 AM  

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